VIDA SIMPLES, VIDA
SAUDÁVEL
Prof. Msc, FRC, Pisc.
Pedro Henriques Angueth de Araujo
Certa
feita, o grande filósofo grego Sócrates encontrou-se na rua com seu discípulo
Filón e seguindo juntos numa conversa animada, depararam com o mercado de
Atenas (o mercado de Atenas daquela época – séc IV a.C. era como uma feira de
rua de qualquer bairro moderno das grandes cidades), quando Filón diz a
Sócrates: se me permite mestre, passarei pelo marcado para realizar algumas
pequenas compras, mas gostaria de continuar em sua companhia.
Sócrates
prontamente acedeu e passou a acompanhar Filón em sua faina mercadista. Das
pequenas compras que Filón disse que ia fazer, só comprou de um tudo.
Resultado: chegou ao outro lado do mercado com as mãos cheias. Sócrates tendo
acompanhado toda essa trajetória, ao saírem do mercado diz a Filón: Vistes de quanta coisa eu não preciso?
Sócrates,
o homem mais sábio do mundo antigo (no meu entender, de todo o mundo até
agora), não precisava de nada que foi comprado por Filón, nem tampouco de tudo
o que estivera exposto no mercado.
Esse
artigo pretende fazer um paralelo entre as necessidades de Sócrates e as
nossas, guardadas as devidas proporções. Começamos fazendo uma pergunta
clássica para essa ocasião: Nós
precisamos de tudo o que adquirimos? Por acaso conseguimos usar em curto
espaço de tempo tudo que temos?
Vou
começar essa discussão, citando um trecho de Erich Fromm em Ter ou Ser?[1]:
“A alternativa ter contra ser não fala
imediatamente ao senso comum. Ao que tudo indica ter é uma função normal de nossa vida: a fim de viver nós devemos
ter coisas. Além do mais, devemos ter coisas a fim de desfrutá-las. Numa
cultura em que meta suprema é ter – e ter cada vez mais – e na qual se pode
falar de alguém como “valendo um milhão de dólares”, como poderá haver
alternativa entre ter e ser? Pelo contrário, tem-se a impressão de que a
própria essência de ser é ter: de que se alguém nada tem, não é”.
Devo
neste ponto salientar que grandes mestres da vida fizeram da alternativa entre
ter e ser a questão central de seus respectivos sistemas. Exemplificando: Buda ensina que, para chegarmos ao mais
elevado estágio do desenvolvimento humano, não devemos ansiar pelas posses e Jesus ensina: “Pois quem quiser salvar
a sua vida, perdê-la-á; quem perder a vida por minha causa, esse a salvará. Que
aproveita o homem ganhar o mundo inteiro, se vier a perder-se, ou a causar dano
a si mesmo (Lucas, 9:24-25). Mestre
Eckhart, místico cristão do séc. XIII ensinava que ter nada e tornar-se
aberto e vazio, e não colocar o eu no centro, é a condição para conseguir
riqueza e robustez espiritual.
Muito
embora os exemplos acima estejam fora do alcance do homem comum, todos nos
servem como exemplo para uma útil meditação. Via de regra, aqueles que muito
têem, possuem uma natural paranóia da possibilidade da perda. Os que nada têem,
normalmente invejam o detentor de bens e muitos até partem para a violência no
afã de obtê-los à força.
Devemos
estar livres de nossas próprias coisas e de nossas ações. Isso não significa
que não devemos ter posses ou que nada façamos; significa que não devemos estar
apegados, atados, encadeados ao que possuímos, ao que temos, e nem mesmo a
Deus, no dizer de Eckhart. Ainda me utilizando da filosofia de Eckhart, nosso
alvo humano é nos livrarmos das peias do apego ao eu, egocentricidade, isto é,
do modo ter de existência, a fim de
chegarmos ao pleno ser.
Consumir
é uma forma de ter, e talvez a mais importante da atual sociedade abastada
industrial. Consumir apresenta qualidades ambíguas: alivia ansiedade, porque o
que se tem não pode ser tirado; mas exige que se consuma cada vez mais, porque
o consumo anterior logo perde a sua característica de satisfazer. Os
consumidores modernos podem identificar-se pela fórmula: eu sou = o que tenho e o que
consumo.
Podemos
facilmente observar que as pessoas que vivem no modo exclusivamente ter não são plenamente felizes e vivem
preocupadas em aumentar suas posses e com medo de perdê-las.
10.06.2019
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